domingo, 14 de agosto de 2016

De repente 30!

De repente 30!


            







Ela acordou, respirou fundo e sentou-se na cama. Ela estava particularmente confusa naquela manhã, faltava uma semana para o seu aniversário, mas algo não estava certo.

Ainda tentando entender a matemática, nada básica, da vida começou a contar. No início usou os dedos das mãos, certa de que neles caberia toda a sua experiência.


Logo se deu conta que a maturidade da alma não acompanha os anos do calendário.  Dez era pouco. Dez é para quem gosta de brincar e rir de piadas bobas, para quem gosta de algodão doce e foge de legumes... pensando bem, dez até que fazia sentido, mas era pouco.

      Então ela olhou para os dedos dos pés, meio a contragosto, e aceitou aumentar a contagem, afinal sua vida já tinha algumas aventuras que seria importante contabilizar.  E então, vinte começou a parecer mais perto da realidade, já era um pouco mais madura, mas não muito. Um pouco mais inteligente, mas também não muito. Com vinte já se pode casar, já sabe o que se quer da vida, já se tem responsabilidades...

“Não, não, pode parar... vinte também não é.” Falou em voz alta.

         Agora sem muita opção, ela precisava ser objetiva, mas ainda não tinha conseguido se convencer:

“Como assim, 30???” Continuava a questionar.

“Então de repente você acorda de manhã e, BUM, tem 30? Não! Não é assim!!!”.

 Ela não tinha muito tempo, logo enfrentaria as pessoas e precisaria explicar o mal-entendido. Sem saber o que fazer se pôs a rezar:

“Querido, Deus! Acredito que tenha havido um pequeno engano, isso acontece, mas preciso que o Senhor faça, urgente, uma recontagem da minha existência, há uma divergência grave de dados! Vou dormir mais uma hora e, quando acordar fingiremos que nada aconteceu.”

Ela estava certa de que em algum momento, alguém havia adiantado os anos no calendário e esqueceu de voltar.

“Será que Deus também burlava as vidas do Candy Crush?”

Foi aí que ela lembrou do vício em joguinhos de celular, e então, aliviada, voltou para 12.  Mas logo se deu conta que com 12 ela brincava na rua e não existiam celulares.

“Droga, isso me acrescenta pelo menos uns 5”.

      E lembrou que foi com 17 a primeira vez que saiu de casa, foi ser psicóloga, mas foi com 17, também, a primeira vez que voltou, psicóloga não foi. Nesse momento, ela começou a rever todas as tentativas, idas e vindas, todos os erros e acertos de sua vida, e isso levou um tempo... eram muitos.

“Putz, então, se for assim, tô com 58!!!”

Logo se acalmou do susto, pois não era tão impossível assim, pensou nas novelas, nas manias, nas horas de sono, na Ana Maria Braga...

     “Não, se fosse assim eu estaria com 87!!!!” Ela estava em forma para 87.

“Mas eu não deveria estar aposentada?” Riu de si mesma.

Nesse momento relembrou de todos os empregos e trabalhos fora do padrão que já teve, lembrou que aceitava qualquer parada, por uma boa e nova aventura, lembrou do seu amor pelos animais e o tempo que passou com eles...

        “Certamente é 24!!” Disse animada.

Mas pensando em tudo que tinha aprendido, o quanto amadureceu, tantas pessoas que conheceu, cidades que passou, inúmeras dificuldades que enfrentou...

“Seria 41?” Caiu dura para trás com as mãos na cabeça.

Ela se virou para o outro lado da cama e decidiu não se levantar. Assim, não teria que lidar com esse tal de número. Afinal o que os olhos não veem o coração não sente. E foi nesse momento que ela também decidiu que não se olharia mais no espelho, nunca mais.

“Eu não posso assistir isso” Disse indignada.

Ela não queria ser expectadora, nem cúmplice desse crime chamado idade. Ficou ali deitada na cama mais um tempo, pensando em novas formas de contabilizar a vida. Ela não achava justo ser enquadrada numa categoria com a qual não se identificava. E ela não se identificava com esse 30. Era um susto acordar e de repente...

“Aff!!!”. Ela sabia que isso não iria funcionar.

Pensou em todos os amigos, nos Natais em família, nas viagens e lugares que conheceu, pensou nas brigas e nos romances, nas risadas e, melhor, lembrou das gargalhadas, daquelas de doer a barriga, que até esqueceu das tristezas. E se deu conta de quanto ela tinha mudado e crescido. Lembrou de tudo que passou, mas, também, se deu conta de que tudo passou, e ela ...

“Chegaaaaa!!!” Gritou!

Então ela percebeu... “De repente coisa nenhuma!!!”

Algo nela, finalmente, começava a mudar...

“Chega de você também!!!” Falava ela sozinha.

“Não! Eu tô falando com você!!!” Ela soava confusa...

”Não tô confusa! Agora eu entendi tudo. Você já pode sair, Dona Narradora! Eu assumo daqui. Obrigada!”

Oi? Uhm! Hehe... Ela parecia brincar com essa que vos fal...

”Não é brincadeira! Vou falar por mim a partir de agora!” Ela interromp...

“Eu interrompi!” Ela insist...

“Eu insisto!"... Eu insisto!

.... e, então, foi pouco antes de 30 anos que ela decidiu se livrar da personagem... e resolvi assumir as rédeas da minha própria vida ... E entendi, que a melhor idade é aquela que se tem!!!


Seja bem vindo, 30!!!!