DIA DE ENTREVISTA
Era uma quarta-feira, dia 09 daquele mês. Acordar inesperadamente gripada em uma cidade como Curitiba, não é algo tão inesperado assim. Com dores no corpo, abatida, congestionamento nasal e todos os outros sintomas se manifestando em mim fui trabalhar. Meu turno começaria às seis da manhã, o que para mim era perfeito, pois no dia seguinte seria a minha folga e a minha tão esperada entrevista de emprego. O emprego dos meus sonhos. E às 17 horas daquele dia estaria dentro de um ônibus. Ninguém sabia disso. Com medo de mais desapontamentos na família (muitas outras entrevistas) resolvi que enfrentaria esse processo seletivo em silêncio.
Quase 11 da manhã, meu corpo pedia
arrego, meu olhar abatido e minha cabeça pesada já era mais do que perceptível
pelos clientes. Uma visita inesperada. Meu pai entra na loja:
“Filha, o que aconteceu?”
Com a voz mole e sem forças
expliquei meu estado. Ele logo vai embora, penalizado e até um pouco assustado
com minha situação. De repente me bate um peso na consciência, afinal mal
consegui conversar com ele, que também não sabia da minha tão esperada
entrevista.
Aquele era um bom momento para por
em prática os conselhos que uma taróloga tinha me dado na tarde anterior. Fui
pedir uma ajuda diferenciada para o grande dia. Após muito perguntar às cartas
chegamos à conclusão que eu já tinha o que era preciso, era só questão de
tempo. A grande descoberta era que eu precisava começar a agradecer meus pais
por tudo que recebi. Que assim seja, alguns minutos depois que meu pai saiu da
loja comecei a digitar uma linda mensagem de celular, nada típica de mim. Era
algo mais ou menos assim: “Pai querido, só queria agradecer por tudo! Um beijo
e te amo!!”
Com as malas prontas é hora de ir
para a rodoviária. Uma viagem de um dia não precisa muitos preparos, a não ser
a comida e a água do pobre cão Guga, que ficaria em casa me esperando. Mas
mesmo assim, achei melhor deixar a chave do apartamento na portaria, para
alguma eventualidade. Mas eu estava certa que iria correr tudo bem. Ir e vir
sem ser notada. Assim, Não daria trabalho a ninguém e não teria que contar a
ninguém sobre mais essa entrevista. Bom, foi assim que eu planejei.
...Mas foi assim que aconteceu:
Meu pai procurando por mim no
trabalho...
- Oi! A Isabela está aí?
- Não, ela não estava bem e pediu
para sair mais cedo!
Meu pai procurando por mim no meu
prédio...
- Oi! Queria falar com a Isabela do
203.
- Ela viajou.
- Viajou?!?!?!
- Sim! Por acaso o senhor se chama
Gino?
- Sim.
- Ah! A Isabela deixou um bilhete e
uma chave para o senhor!
- Bilhete? Chave?
..... ele saiu com as pernas bambas.
No ônibus, 4 horas de viagem, dois
antigripais com excelente ação sonífera. Só acordaria lá. Enquanto isso em
Curitiba começava os telefonemas. O meu celular desligado. Minha mãe que estava
em Campinas, também não sabia da minha viagem. E também tinha recebido uma
linda mensagem de agradecimento. Ninguém sabia de mim. Claro, eu tinha saído
escondida! Não era para ninguém saber!
Cheguei ao meu destino e ainda
sonolenta liguei o celular. Susto! Nove ligações perdidas, tias, mãe, pai.
Alguém morreu!!! Certeza que alguém morreu... pernas bambas. E lá de Camboriú
começavam as ligações, celulares todos desligados. Mãe, pai, tias... eu nem
deixava a musiquinha começar a tocar e já estava ligando para o próximo número.
Pernas bambas! Era óbvio, celulares desligados, pois estavam todos na estrada
indo para a cidade do falecido. Mas quem era? O que teria acontecido? Para
aonde estariam todos indo?
Em Curitiba os preparativos para o
velório já estavam a ponto de começar.

Antes que eu pudesse retornar a
ligação o telefone toca novamente. Era a esposa do meu pai. Mas eu não podia
atender. Trágico, mas verdadeiro, tinha apenas três reais de crédito. Se
atendesse qualquer ligação ficaria incomunicável (até por mais créditos).
Eu retorno, e a musiquinha logo se
intromete... Só podiam estar na estrada! Entrando e saindo de área... pensava
eu.
Com as lágrimas já escorrendo...por
quem quer que fosse! Tento ligar mais uma vez. Desolada, trêmula, sem reação,
minhas mãos já não respondiam mais ao meu comando. Não desliguei o
celular. Dessa vez apenas deixei aquela voz automática falar. Eu não estava
mais ouvindo, não estava mais ali. Então a mensagem mais uma vez
entra dizendo: “Tã nã nããã, para completar essa ligação digite o DDD mais o
cód...”
Eis que uma nuvem negra
se desfaz....
Ahhhhhhhhhh o DDD e o código da
operadora!!!!!!!!!!!!!!!! Como eu pude esquecer, eu estava em outro estado.
Eles não estavam com os celulares
desliados. Rindo da minha burrice eu começo retornar as ligações:
- Oi, mãe! Tudo bem?
- MINHA FILHA
ONDE VOCÊ ESTÁ?????? LIGA PARA O SEU PAI AGORA! – Gritando.
- Mas mãe tá tudo
bem?????
- LIGA PARA O SEU PAI
QUE ELE ESTÁ PREOCUPADO! (letras maiúsculas significa que ela ainda estava
gritando)
Ops! Acho que era hora
de contar...
- Oi, pai! Tudo bem?
- FILHA O QUE ACONTECEU COM VOCÊ???
VOLTA PARA CASA! POR FAVOR, NÃO SE MATE!!!!!!
Moral da
história.................
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